terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Ficou tudo por dizer




Tudo o que ficou por dizer 
porque de repente 
era a hora do comboio 
ou um telefone longínquo tocava
 ou um qualquer acidente aconteceu. 
 Tudo o que ficou por dizer
 porque o pudor calou a voz
 porque um orgulho surdo a interrompeu 
porque as palavras talvez já nem chegassem 
ou era tarde 
e o cansaço aos poucos foi levando a melhor. 
 Tudo o que ficou por dizer
 porque a dor doía em demasia
 e era necessário que as palavras
 fossem capazes de ser claras como o ar
 porque as palavras traem 
como gumes de facas que nos cortam. 
 Tudo o que ficou por dizer
 porque a tristeza apertou tanto a garganta 
que nenhum som saía 
nem o olhar continha 
em desespero
 uma lágrima ainda assim contida.
 Tudo o que ficou por dizer
 porque o tempo urgente 
se esvaía
 e de repente já não estava 
no lugar a quem havia que o dizer
 quem ainda há pouco nos ouvia. 
 Tudo o que ficou por dizer 
e tudo
 o que ficou por dizer 
ou tudo
 sempre
 por dizer. 






 Bernardo Pinto de Almeida